sábado, 17 de julho de 2010

Bom dia...
Hoje saio um pouco do foco do blog para falar sobre... "as coisas certas!"
Voltando para casa hoje, parei em um sinal fechado e vi uma criança de aproximadamente 10 anos de idade, apertar o botar para pedestres abaixo do sinal... Ele ficou aguardando o sinal abrir para que pudesse atravessar a rua, que realmente estava movimentada. Durante o período em que ele esperou, vários adultos, atravessaram correndo, mesmo com o sinal fechado e colocando a própria vida em risco. Nesse momento observei que o pequeno rapaz, começou a se sentir envergonhado de estar ali esperando enquanto todos atravessavam, mesmo com o sinal vermelho para os pedestres... E o que ele fez? Saiu do seu local seguro e para despistar os motoristas que estavam, supostamente o observando e foi atravessar a rua em um local atrás dos carros, onde não havia faixa de pedestres e nem sinalização que pudesse protegê-lo. Esse é o mundo em que vivemos e a atitude que dia a dia tomamos em nossas vidas. Gostamos de fazer o certo e queremos fazer a coisa certa, mas as vezes por vergonha e para que não pareçamos "ingênuos" ou "otários", tomamos atitudes que colocam nossas vidas, reputação e caráter em risco. Podemos passar por pessoas que não somos, mas com certeza, essa é uma das maiores causas da doença do século, a depressão que assola grande parte da população. Sejamos mais nós mesmos, sem medo de parecer infantis, ingênuos ou otários... O mundo precisa disso e nós, muito mais...

sábado, 16 de maio de 2009


Grande qualidade de vida!
João Ubaldo Ribeiro

Antigamente, não havia qualidade de vida. Quer dizer, não se falava
em qualidade de vida. Agora só se fala em qualidade de vida e, em
matéria de qualidade de vida, sou um dos sujeitos mais ameaçados que
conheço. Na verdade, me dizem que venho experimentando uma
considerável melhora de qualidade de vida, mas tenho algumas dúvidas.
Minha qualidade de vida, na minha modesta opinião pessoal, não tem
melhorado essas coisas todas, com as providências que me fazem tomar
e as violências que sou obrigado a cometer contra mim mesmo.
Geralmente suporto bem conversas sobre qualidade de vida, mas tendo
cada vez mais a retirar-me do círculo ou recinto onde me encontro,
quando começam a falar nela.
A comida mesmo me faz estar considerando, no momento, comprar uma
balança de precisão e um computador de bolso com um programa
alimentar especial. Antes eu comia do que gostava. Fui criado, por
exemplo, com comida frita na banha de porco ou, mais tarde, na
gordura de coco. Meus avós, todos mortos depois dos noventa (com
exceção do que só comia o saudabilíssimo azeite de oliva — e ele
morreu de AVC) comiam banha de porco e torresmo regularmente, mas,
claro, ainda não tinha sido informados de que se tratava de prática
mortal. Aliás, comida saudável, que se ensinava nos manuais até para
crianças, era composta de leite integral, ovos, pão (com manteiga),
carne vermelha ou peixe — frito, então, era uma maravilha para
estômagos delicados — frutas e legumes à vontade.
Depois disso, até atingirmos a atual qualidade de vida, fulminaram o
leite. Alimento completo, passou a ser encarado com desconfiança, e
hoje não sei de ninguém que beba leite integral, a não ser, talvez,
algum gorila do Zoológico. O ovo sofreu ataque violentíssimo, assim
como o açúcar, a ponto de, tenho certeza, várias receitas
tradicionais de doces serem hoje achados arqueológicos, e as poucas
que restam constituam uma imitação desenxabida das que empregavam
ingredientes normais e não essas massas e líquidos insossos que vivem
distribuindo, como leite, manteiga etc. Claro, mudaram de idéia a
respeito do ovo recentemente, mas a mudança de idéias deles só pode
ser vista com desconfiança.
Não houve o tempo, e não é preciso ser nenhum Matusalém para lembrar,
em que para substituir a manteiga era exigida margarina, alimento
saudabilíssimo, que não fazia nenhuma das monstruosidades operadas
pela manteiga? O negócio era margarina e durou bastante, até que
descobriram que margarina pode ser até pior do que manteiga. Melhor,
na verdade, abolir manteiga inteiramente. E margarina, claro, nem
pensar. Carne vermelha é uma abominação. Carne de porco é um terror.
Vísceras de qualquer tipo devem ser evitadas como o diabo foge da
cruz. Açúcar, meu Deus! Sorvete? Só para crianças, e crianças de pais
irresponsáveis. Aliás, é um bom desafio achar algo unanimemente
aprovado pelos nutricionistas, a não ser, tudo indica, capim.
Mas ninguém pode viver de capim, de maneira que, relutantemente,
deixam a gente comer uma coisinha qualquer, contanto que não
ultrapassemos o limite de calorias e não ingiramos o proibido e,
mesmo assim, com restrições. Peixe cozido ou grelhado, por exemplo,
geralmente pode, mas paira sobre seu infeliz consumidor a ameaça de
que não esteja fresco ou esteja contaminado por metais pesados e pelo
lixo que jogam em rios e mares. Peito de frango (e eu que sou homem
de coxas e antecoxas) também assusta, por causa dos hormônios que dão
às galinhas e as neuroses que elas desenvolvem, nascendo sem mãe e
sendo criadas em cubículos em que mal podem se mexer, a ponto de
terem de ser debicadas, para não se autodevorarem histericamente. Ou
seja, mesmo comendo um peito de galinha sem uma gota de qualquer
gordura e acompanhado somente por matos e alguns legumes (cuidado com a contaminação de tomates, cenouras e alfaces!), o infeliz se arrisca.
Mas vou usar o computador para calcular as calorias, as gorduras e
outras características de cada refeição, porque, agora que minha
qualidade de vida está melhorando a cada dia, preciso ser coerente.
Fumar, não mais, nem uma pitadinha depois do café (que ninguém sabe
direito se faz bem ou faz mal, temperado com adoçante, que também
ninguém sabe se faz bem ou faz mal). Beber, esqueça, vai deixar você
demente aos 60, além de dar cirrose e hepatite. O famoso copinho de
vinho, além de ser uma porção ridícula, também está sendo questionado
no momento. Parece que não é bem assim, e uma autoridade no assunto
disse outro dia no jornal que o melhor é tomar suco de uva — não
industrializado, é claro, por causa dos aditivos.
Restam também os exercícios. Fico felicíssimo, quando, suando e
bufando no calçadão, sinto o ar fresco invadir os meus pulmões
(preferia logo uma tenda de oxigênio), as pernas doendo e a certeza
de que minha qualidade de vida vai cada vez melhor. Até minha pressão
arterial (13 a 14 por 8), que era considerada boa para minha idade,
agora já é alta e o pessoal dos 12 por 8 já começa a entrar na faixa
de risco. Enfim, é duro manter esta boa qualidade de vida, ainda mais
agora que me anunciam que caminhadas somente não bastam, tem de
malhar também. Ou seja, temos que nos dedicar o tempo todo a manter
nossa qualidade de vida. Mas, aqui entre nós, se vocês no futuro
virem um gordão tomando caldinho de feijão com torresmo no boteco,
depois de um chopinho, e o acharem vagamente parecido comigo, talvez
seja eu mesmo, sofrendo de uma pavorosa qualidade de vida. A
diferença é grande. Tanto eu quanto vocês vamos morrer do mesmo
jeito, mas vocês, depois da excelente qualidade de vida que estão
desfrutando aí com sua rúcula com suco de brócolis, vão ter uma ótima
qualidade de morte, falecendo em perfeita saúde e eu lá, no meu
velório, com um sorriso obeso e contente no rosto dissoluto.

Esta crônica foi publicada pelo jornal O Globo em 06/07/2003.

Faço minhas, as palavras de João... Ótimo final de semana!!!